Para que decisões judiciais, documentos públicos ou laudos arbitrais emitidos no exterior sejam reconhecidos no Brasil, é necessário que passem por um processo de homologação de decisão estrangeira no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Esse procedimento é a única forma que possibilita atribuir validade jurídica a esses documentos, a fim de que produzam efeitos legais no território nacional.

O Processo de Homologação de Decisão Estrangeira (HDE)
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem competência para processar e julgar originariamente a homologação de sentenças estrangeiras, conforme texto inserido no artigo 105, inciso I, alínea "i" da Constituição Federal, com a devida observância aos ditames dos arts. 15 e 17 do Decreto-Lei n. 4.657/1942 (LINDB), 216-A e seguintes do Regimento Interno do STJ e do Código de Processo Civil (art. 960 e seguintes).
O processo possui natureza homologatória, ou seja, não permite discutir o mérito ou a extensão da decisão estrangeira. O STJ exerce um juízo meramente delibatório, verificando os requisitos legais, bem como se houve violação à soberania nacional, à dignidade da pessoa humana e à ordem pública.
Requisitos para a Homologação de Decisão Estrangeira
Constituem requisitos indispensáveis à homologação da decisão estrangeira (art. 963, CPC):
I - ser proferida por autoridade competente;
II - ser precedida de citação regular, ainda que verificada a revelia;
III - ser eficaz no país em que foi proferida;
IV - não ofender a coisa julgada brasileira;
V - estar acompanhada de tradução oficial, salvo disposição que a dispense prevista em tratado;
VI - não conter manifesta ofensa à ordem pública.
Casos em que a Homologação de Sentença é Obrigatória
Nem toda decisão judicial estrangeira precisa ser homologada, mas há situações em que ela é obrigatória. Veja os casos seguintes:
Divórcio
A homologação da sentença de divórcio será obrigatória quando, além da dissolução do matrimônio, envolver disposição sobre guarda de filhos, alimentos e/ou partilha de bens. Essa situação é denominada de divórcio qualificado (art. 464, § 3º, do Provimento n. 149/2023 da Corregedoria Nacional de Justiça).
Cobrança de Dívidas
Decisões estrangeiras que reconhecem débitos só podem ser executadas no Brasil após a homologação.
Testamentos, Inventários e Partilhas de Bens
A Justiça brasileira possui competência exclusiva para proceder ao inventário e à partilha dos bens situados no Brasil, independentemente do domicílio ou da nacionalidade do autor da herança.
Guarda de Menores e Prestação Alimentícia
As decisões judiciais estrangeiras sobre guarda de filho menor, direito de visita e alimentos, devem ser homologadas para que sejam transportadas para o ordenamento pátrio, o direito pleno dos responsáveis legais.
Documentos Necessários para a Homologação de Sentença Estrangeira
A obtenção da homologação requer a apresentação de documentos específicos. Alguns documentos essenciais que devem ser anexados à petição inicial:
Cópia integral da decisão estrangeira;
Trânsito em julgado (declaração que ateste a definitividade da decisão);
Tradução juramentada;
Apostilamento ou legalização consular no país de origem do documento, salvo a existência de tratado que dispense o apostilamento (Convenção da Haia) ou a legalização consular;
Documentos de identificação das partes;
Procuração pública em favor do advogado contratado.
Dependendo da natureza da sentença, outros documentos específicos podem ser solicitados.

Apostilamento e Legalização de Documentos
Documentos emitidos no exterior devem ser acompanhados de chancela consular ou apostilamento, a saber:
Apostilamento (Convenção da Haia) - O apostilamento é o certificado que cumpre os termos estabelecidos na Convenção da Haia, que aboliu a exigência de legalização consular de documentos públicos estrangeiros entre os países signatários.
Legalização consular - É o processo de autenticação de documentos no contexto internacional, feito perante um consulado ou embaixada. A legalização é necessária quando o país não aderiu à Convenção da Haia.
Dispensa de legalização ou apostilamento
Alguns países mantêm tratados que eliminam a formalidade de apostilamento ou chancela consular. Nesses casos, os documentos públicos são aceitos entre os países acordantes independentemente de apostilamento ou chancela consular. Um exemplo é o Decreto 3.598/2000, artigo 23, que facilita a cooperação jurídica entre Brasil e França.
Questões sobre Divórcio Realizado no Exterior e o Processo de Homologação de Decisão Estrangeira
A homologação de sentença estrangeira de divórcio pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) é necessária nos seguintes casos:
Divórcio Litigioso - Quando não há acordo entre os cônjuges sobre a dissolução do matrimônio;
Divórcio Consensual Qualificado - Ocorre quando, mesmo havendo consenso entre os cônjuges, o divórcio envolver questões sobre guarda de filhos, pensão alimentícia ou divisão de bens.
O Divórcio consensual simples ou puro independe de prévia homologação da sentença estrangeira pelo Superior Tribunal de Justiça e/ ou de prévia manifestação de qualquer outra autoridade judicial brasileira (Provimento nº 149 do CNJ).
Homologação de Sentenças de Guarda e Alimentos - Revisões Futuras
A homologação de decisão estrangeira não impede o posterior ajuizamento de ação revisional de guarda de menores ou alimentos, que pode ser proposta no Brasil ou no exterior.
Em situações de competência concorrente, a primeira decisão que transita em julgado prejudica a outra. Exemplo: se houver uma decisão judicial brasileira e outra no exterior sobre o mesmo fato, a prioridade cronológica é um dos critérios a serem considerados.
No entanto, conforme previsto na Convenção da Haia de 2007 (Convenção sobre a Cobrança Internacional de Alimentos) e na Convenção da Haia de 1980 (Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças), todas as medidas concernentes às crianças, o interesse superior da criança será considerado prioritário.
Consequências da não Homologação de uma Decisão Estrangeira
Não há punições para a falta de homologação de uma decisão estrangeira, mas a falta de homologação impede que ela produza efeitos legais no Brasil, causando diversas complicações, como:
Inexecução de obrigações - Dívidas, obrigações contratuais ou determinações judiciais permanecem sem eficácia no Brasil. Isso significa que a parte interessada não poderá executar a decisão estrangeira para obter o cumprimento da obrigação;
Estado civil irregular - A falta de homologação de um divórcio impede o reconhecimento da nova situação civil no Brasil. Isso significa que a pessoa ainda será considerada casada no Brasil, o que pode impedir um novo casamento, a alteração de documentos pessoais e gerar problemas em relação à herança e outros direitos;
Obstáculos em inventários e transações patrimoniais - Uma sentença estrangeira não homologada que trate de questões sucessórias ou patrimoniais, inviabiliza a realização de inventários, a transferência de bens situados no Brasil, o acesso a contas bancárias e a obtenção de documentos públicos;
Insegurança jurídica em relações comerciais - As relações comerciais que envolvam empresas de diferentes países podem ser prejudicadas por ausência de eficácia jurídica das decisões.
Homologação de Decisão Arbitral Estrangeira
O reconhecimento e a execução de sentenças arbitrais estrangeiras é disciplinado pela Convenção de Nova York (1958), da qual o Brasil é signatário. As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis (art. 1º, Lei nº 9.307/1996).
As sentenças arbitrais podem ser proferidas por árbitros nomeados para casos específicos ou por órgãos arbitrais permanentes aos quais as partes se submetem.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) exerce juízo meramente delibatório nas ações de homologação de sentenças arbitrais estrangeiras; não lhe cabe adentrar ao mérito, mas somente verificar se a pretensão atende aos requisitos previstos no Código de Processo Civil (CPC), no Regimento Interno do STJ (RISTJ), na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) e na Lei de Arbitragem.
O que Fazer Após a Homologação da Decisão Estrangeira
Após o trânsito em julgado da decisão estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), será necessário cumprir algumas etapas, como:
Registrar e averbar a decisão - Apresentar a carta de sentença homologada ao cartório competente para as devidas anotações;
Executar a sentença - Iniciar o processo de execução junto à Justiça, caso seja necessário efetivar obrigações, cobranças ou transferências decorrentes da sentença estrangeira. O cumprimento de decisão estrangeira far-se-á perante o juízo federal competente, a requerimento da parte, conforme as normas estabelecidas para o cumprimento de decisão nacional (art. 965, CPC).
Essas providências são essenciais para que a decisão estrangeira produza na prática os efeitos desejados no Brasil, seja para fins pessoais, patrimoniais ou comerciais.

Homologação de Decisão Estrangeira e Acordos e Tratados Internacionais
Tratados e acordos internacionais são pactos celebrados entre Estados e Organizações Internacionais, regidos pelo Direito Internacional, que abrangem questões das relações internacionais, como: paz, comércio, aplicação de leis e muitas outras questões.
O Brasil mantém diversos tratados e acordos internacionais que simplificam a homologação de decisões estrangeiras e fortalecem a cooperação jurídica internacional. Entre os principais instrumentos destacam-se:
Convenção da Haia sobre Apostilamento (1961)
Simplifica a legalização de documentos públicos entre os países signatários, substituindo a legalização consular pelo apostilamento. A lista de países que aderiram a esse tratado está disponível no Link da HCCH: Status Table - Convenção da Haia
Tratados Bilaterais de Cooperação Jurídica
O Brasil possui diversos tratados que simplificam a homologação de decisões judiciais estrangeiras. Exemplos:
Portugal - O Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta, simplifica a validação de decisões entre os dois países;
França - Dispensa a chancela consular ou apostilamento em documentos públicos por força de tratado internacional, Dec. nº 3.598/2000, Capítulo VII, Artigo 23), de acordos de cooperação jurídica em matéria civil;
Argentina - Dispensa a legalização em documentos judiciais e públicos tramitados pelas Autoridades Centrais, conforme o Decreto nº 1.560/1995, artigo 23.
Esses instrumentos de cooperação internacional simplificam procedimentos técnicos, promovem maior integração jurídica e fortalecem a confiança entre os Estados.
Considerações Sobre a Homologação de Decisão Estrangeira
A homologação de decisões estrangeiras é um tema de relevância no mundo globalizado. Por meio desse procedimento, assegura-se que sentenças proferidas no exterior sejam reconhecidas e executadas no Brasil, proporcionando segurança jurídica em aspectos pessoais, patrimoniais e comerciais.
A correta observância dos requisitos legais, a preparação adequada dos documentos e o conhecimento dos acordos internacionais vigentes contribuem para que o processo de homologação ocorra de modo ágil e eficiente. Com esses cuidados, não só promove a integração jurídica internacional, mas também evita conflitos e incertezas no ordenamento nacional.
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